quinta-feira, 15 de fevereiro de 2024

Cada Soneto Um Moído - Cria

 

Eu não tive pai. Meu pai não me assumiu como filho, por diversas circunstâncias que não vêm ao caso agora. Fui criado pela minha mãe, tias e avó. Não ter um pai não me causou nenhum trauma permanente, pois como eu nunca tive a presença dele, eu nunca senti falta. Em alguns momentos da infância e, posteriormente, na vida adulta senti a falta de uma figura masculina para me dar apoio. Todavia, foram necessidades momentâneas que rapidamente foram sanadas pela minha constante necessidade de seguir em frente.

Em 19 de Abril de 2022, meu filho Joaquim Gregório veio ao mundo. A parti do momento que ele saiu da barriga da mãe, eu amei. Palavra! Nunca senti o que sinto por ele por nenhum outro ser humano com quem convivi neste planeta. Várias vezes digo que a poesia me salva, essa foi uma delas. Joaquim era e é poesia viva. Seus olhos são meus guias. Por causa dele, eu sou o maior covarde do mundo, repleto de medos e receios. Por causa dele, eu sou o homem mais valente do mundo, disposto a tudo para protege-lo. E quando digo tudo, é tudo mesmo. Ele tem a minha vida em suas mãos e por ele abdico dos meus sonhos e passo a reconstrui-los ao seu lado. Ele é meu filho e eu sou o pai dele. Depois da morte, esta é minha única certeza nesta vida.

Dito isto, depois do nascimento de Joaquim comecei a me questionar: Como um homem pode ter um filho, ter um amor deste tamanho a sua disposição, e não usufruir? Como pode um homem abandonar um filho? Por que o meu pai me abandonou? Por que ele não sentiu por mim, o que eu sinto por Joaquim?

Foi diante destes questionamentos que fui procurar o meu pai. Descobri que ele estava morto há oito anos. Também descobri três irmãos. Descobri novos primos, tios e avós. Entrei em contato com algumas tias, irmãs do meu pai, após um longo período de indecisão. Para minha surpresa elas foram bastante receptivas e ainda hoje mantenho boas relações com elas. Meus irmãos não querem contato comigo. Normal, afinal eu sou um bastardo.

Falei para minhas tias que o motivo da procura eram os questionamentos citados acima. Elas entenderam e até me disseram que foi bom eu não ter tido contato com o meu pai. Me revelaram que ele não tinha sido um pai carinhoso e atencioso, provavelmente, acham elas, por ele não ter recebido isto do seu pai. Ele era um provedor e nada mais. Depois de todos estes encontros e depois de várias informações assimiladas, eu senti orgulho de mim.

Apesar de tudo que ocorreu em minha vida, e de todo ressentimento que eu poderia ter guardado, eu quebrei o ciclo! Eu não sou o meu pai. Sou o melhor pai que eu posso ser para Joaquim. Quero não somente estar presente em sua criação, eu quero que ele saiba que qualquer futuro que ele escolha percorrer eu estarei ao lado dele. Eu sou um homem quebrado e sei o quanto é duro juntar os pedaços de uma vida de sucessivas pancadas, é por este motivo que não quero quebrar a vida de ninguém, muito menos do meu filho.

Hoje tenho a plena convicção que todos os pais (mãe e pai) são as criaturas mais abençoadas da terra por poderem observar diariamente uma vida se desenvolver. Criar um filho é uma aventura sagrada (no sentindo mais puro da palavra) e que constantemente nos engrandece.

Cria

Perco a dor de existir nos meus degredos

quando brilho nos olhos do meu filho!

Pulsa vida e meu pranto desvencilho

no sorriso que quer os seus brinquedos.

 

Que doçura ter lúdicos segredos

que no chão, junto a ele, compartilho.

E por ele me podo e me humilho,

pois eu sou um devedor dos seus enredos!

 

O meu sonho se perde convertido

em menores deleites sem valor.

Só meu verso tem firme se mantido,

 

revelando a matriz do seu frescor:

Toda noite a Poesia tem dormido

nos meus braços, coberta de Amor!


Clique no link abaixo para ouvir este soneto declamado:




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