quarta-feira, 7 de fevereiro de 2024

Retalhos do Jornal - Luiz Gonzaga, o Rei do Baião, na Capital da Paraíba

 

Me recordo claramente dos três primeiros momentos em que ouvi as canções do Rei do Baião, talvez o único rei legítimo da música brasileira, Seu Luiz Gonzaga. Sim, destaco três, pois vieram encarrilhados: Um alegre, um familiar e um triste!

Sei que isso é um assunto pessoal, mas confia em mim, tem tudo a ver com o Retalho de Hoje!

Data do Retalho: Terça-feira, 14 de abril de 1953

Jornal: O Norte

Título do Retalho: Luiz Gonzaga, o Rei do Baião, na Capital da Paraíba

Autor: Desconhecido

O ano era 1996, eu estava lá com meus oito anos de idade. Este ano me marcou demais, pois vários perrengues, que não vêm ao caso, ocorreram, de formas que tenho vivida a memória dos acontecimentos naquele período. Sendo assim, o primeiro momento em que ouvi os acordes do Baião foram em junho, do ano citado, na quadrilha junina da escola.

Eu já havia participado antes desse momento de quadrilhas escolares, porém, devido ao que relatei, a recordação da deste ano traçou um risco em minha mente. Na festa, dividindo espaço com o sucesso da época, a Banda Matruz com Leite, escutei Seu Luiz cantando Riacho do Navio. Me lembro bem da minha curiosidade, não sanada na época, em querer saber que lugares era aqueles narrados na poesia. E que maluquice era aquela de um peixe querer sair do mar e voltar para o rio?

“Riacho do Navio

Corre pro Pajeú

O rio Pajeú vai despejar

No São Francisco

O rio São Francisco

Vai bater no meio do mar”


Já citei em outras colunas do meu encanto por romances e filmes de cavalaria. De algum modo, estes versos me lembravam essas histórias. Com nomes estranhos como "Riacho do Navio", que descreviam localidades distantes e mitificadas como "Pajeú", tudo aquilo acendia a centelha da fantasia na mente daquele menino sonhador que crescia nas ruas da cidade de Bayeux e que pouco tinha contato com o Sertão. Neste primeiro contato memorizado com a música do Velho-Lua, eu abracei a felicidade que seu ritmo oferecia e toda magia atemporal e oculta que há em suas melodias.

O segundo momento, ainda no mesmo mês junino, foi em uma viagem para o Sertão de que minha família é oriunda: O Casserengue. Íamos todos (primos, tias, avós) para casa de Tia Nina, irmã do meu Bisavô Manu. A casa dela ficava, e fica, localizada na zona rural do pequeno município. Lugar seco, pedregoso e castigado, que tem seu clima mais ligado a região árida do Curimataú do que a região Brejeira dos seus vizinhos úmidos, os municípios de Solânea e Bananeiras.

Recentemente, descobri que minha família está naquela região há mais de 250 anos, o que me enche de orgulho. Foram pequenos agricultores que em certo momento migraram para capital do estado. Mas foi lá, no Sítio Bolhões, entre conversas e brincadeiras, cercado de facheiros, palmas, agaves, rezes, bodes, galinhas, do sol poente e da fogueira que crepitava forte na frente da casa Tia Nina, que ouvi seu Luiz Gonzaga cantarolar lamentosamente:

“Numa tarde bem tristonha

Gado muge sem parar

Lamentando seu vaqueiro

Que não vem mais aboiar

Não vem mais aboiar

Tão dolente a cantar”


O terceiro momento em que o Gonzagão riscou na minha lembrança foi em uma reportagem, do programa Fantástico da Rede Globo, naquele mesmo ano. Ela narrava a seca que assolava o Nordeste e que se arrastaria para os anos vindouros de 1997, 1998 e 1999. Ainda procurei a reportagem para anexar a esta coluna, porém não encontrei. Nela, o repórter narrava o sofrimento de crianças, desnutridas, do Sertão pernambucano que tinham somente a Palma para comer, e comiam. Me recordo do choque que tomei ao ver crianças sendo obrigadas a comer a mesma comida que meus primos do Casserengue ofereciam aos rezes.

Tristemente, Asa Branca, foi reproduzida na reportagem como uma trilha sonora do sofrimento dos meus irmãos nordestinos. Ainda hoje me emociono ao lembrar daquelas cenas, ainda mais sendo hoje um pai, e sempre que escuto esta música em qualquer ambiente ou contexto uma melancolia toma conta do meu peito:

“Quando olhei a terra ardendo

Qual fogueira de São João

Eu perguntei a Deus do céu, aí

Por que tamanha judiação

Eu perguntei a Deus do céu, aí

Por que tamanha judiação”!


Seu Luiz Gonzaga, O Rei do Baião, foi e é o maior representante artístico do Brasil Real que nossa cultura produziu. Um verdadeiro monarca que, com as bênçãos de Santa Luzia, fez ecoar com sua voz todas as agruras e alegrias do seu povo. Uma entidade que, com uma coroa de flores de Jitirana, cantou os pássaros, as árvores e todas as belezas naturais do seu lugar. Um espelho de beleza, onde cada nordestino se enxergava vibrante, feliz e potente. O Nordeste, com todos os seus defeitos, ainda ama e idolatra o seu maior ídolo. Todo nordestino tem uma história para contar envolvendo e Velho-Lua. A prova disto é que, eu que não acompanhei sua atuação em vida, nas festas entre amigos e familiares, ainda pego meu triângulo e canto junto aos meus de peito aberto e desafinado:

"O meu cabelo já começa prateando

Mas a sanfona ainda não desafinou

A minha voz vocês reparem eu cantando

Que é a mesma voz de quando meu reinado começou"

Sobre o Retalho de hoje? É uma bela exaltação ao homem que conquistou o país com sua sanfona e que faria uma passagem pela capital do nosso estado, a Paraíba!





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